quarta-feira, 24 de junho de 2009

Balanço 2

Tomando como referência o tempo natural, o qual constumamos dividir em segundos, horas, dias, anos, etc, completo hoje 4 meses em Barcelona. E mais uma vez vamos nos impresionar: “Jáááááááá?????? Noooossa, como o tempo passa rápido!”. E muito sabiamente uma voz me corrigirá, dizendo: “Não é o tempo que passa, e sim, nós que passamos por ele”. Seja como for, o fato é que quando penso que já passei um terço do tempo que planejei para minha estadia em Barcelona…uhhh… por um lado me assusto, juro. Por outro… me acalmo… não é nenhum bicho-de-sete-cabeças e acho que já aprendi a conviver com a saudade que não me deixa um só minuto.

Mas se tomamos como referência o tempo psicológico, aquele medido pelo que vivemos, fazemos e sentimos… olha… já devo estar aqui há pelo menos o dobro do tempo. Caramba, quanta coisa passou, por quantas coisas passei, quanta informação, quantas sensações… intenso mesmo, viu?

Seguindo a mesma configuração do balanço do primeiro mês, deixa só eu listar algumas coisas que passaram nesses 4 meses e que me vêm agora à cabeça:

- Fechei minha primeira estação em Barcelona: cheguei no fim do inverno, acompanhei toda a primavera e agora acabamos de entrar no verão. Estações bem definidas com mudança de paisagem e tempertauras… gente… eu nunca tinha visto isso na vida!!!


- Já morro de calor na rua, ando de sandalinhas, camiseta, vestido… Preciso comprar um filtro solar, o povo já tá me chamando de morena!!


- Já fui a Milao, Veneza, Valencia, Madrid, La Vera, Girona, Tarragona…


- Já afirmo para quem quiser ouvir: adoro esse cidade, cada dia mais e já posso servir de guia para quem se aventurar por essas bandas!


- Já comecei e larguei um curso de catalão


- Já misturo o português com o español…rsrs… isso é real gente… algumas palavras como piso (apartamento), locutorio (cyber), basura (lixo), são inevitáveis. Eu achava que isso era coisa de gente que gosta de aparecer, mas sempre que estamos entre brasileiros falamos do quanto isso é engraçado.


- Já dou informação na rua pros turistas desnorteados…haha


- Já tô terminando a primeira parte do Master e planejando uma mudança nos meus estudos (mais informações em breve…)


- Já nao converto mais euro em real. Para mim hoje 1 euro = 1 real. Se não for assim… Uff… melhor desistir de viver aqui.

- Já troquei o “afemaria” ou o "ixe" pelo “uffff”, percebeu?


E tantas outras que nem tem como traduzir. Tantas, tantas. Aprendizado intenso. Recomendo a experiência… viu Rosana????

Pros que ainda não viram, atualizei as minhas fotos no www.picasaweb.google.com/acclira. Clicando na galeria de fotos que pus aqui no blog se pode acessar uma das pastas. Mas pode procurar direitinho que já tem um monte de fotos distribuídas em várias pastas.

Já sei que não cumpri a promessa de postar textos aqui com mais frequência… Muitos deles ainda estão na minha cabeça aguardando o momento de virar palavra. É que junto com todas as experiências também tô aprendendo a não me cobrar tanto e fazer as coisas no meu tempo... (uma maneira bonita de dizer tô curtindo a vida boa sem culpas).

Desta vez prometo me esforçar mais para cumprir minhas promessas, ok?

terça-feira, 9 de junho de 2009

Trem das 14 horas/ Sentido Tarragona

Ao chegar na Estazione Centrale de Milano ela sentiu que a angústia que há dias a acompanhava ainda se fazia presente. Entrou na carrozza de número 6, ocupou o posti 74 corridoio. Sempre preferiu viajar na janela, mas diante da novidade de viajar em terras italianas, o corredor estava mais que suficiente. Só com o trem em movimento se deu conta de que chegaria a Veneza de costas. Não lhe agradava nada viajar nesta posição, sentia uma espécie de enjoo psicológico. A sensação de andar para trás lhe dava a impressão de que, junto com o trem, ia toda a sua vida. Enquanto a companheira portuguesa olhava o distante horizonte à sua frente, um futuro colorido e promisor, a ela restava fitar, com a habitual melancolia, tudo o que o trem já havia deixado para trás e que, aos poucos, ia se perdendo no horizonte daquela manhã cinzenta de sexta-feira. Por que era sempre assim? Por que ela sempre fazia com que fosse assim? Nao lhe faltavam por quês e, no fundo, sabia que podia responder a todos eles. Aprender a manejá-los era então o seu desafio.

No horizonte cada casebre de pedra que desaparecia lhe recordava uma história, uma pessoa, uma sensação. Não tardou a perceber que a tudo poderia dar um sentido.

Outro companheiro de viagem, o mexicano, lhe entrega o ipod e apresenta uma canção sobre um homem perfeito-saudável-bonito-respeitado-bem-sucedido-e-tudo-mais:
“He´s a well respected man about town/ doing the best things so conservatively…”
Se divertiu com a música e logo pensou o quão aborrida seria a sua vida se fosse assim tão linear. Por outro lado sua constante inconstância já começava a causar um certo cansaço.

Melancolicamente seguiam ficando para trás as histórias, pessoas e sensações. Até que, com uma leve inclinação de tronco e um giro de cabeça, por uma simples questão de acomodação, pôde contemplar o horizonte por um ângulo diferente. Estava agora de frente para o presente e ali ficou o tempo suficiente para começar a dar sentido às coisas. Percebeu que o presente mais próximo, que ficava na parte mais baixa, passava mais rápido, tanto que quase só o via como um vulto, um rastro. No ponto mediano do horizonte estava o presente em velocidade apreensível, confortável. Mas era no topo, no extremo mais distante do horizonte presente, que seguia ali, leve e constante, a sua angústia.

Nas poltronas à sua frente, os companheiros de viagem se divertiam em tentar interromper seu estado contemplativo:

“– La actriz que lleva dentro le usa a cada día.”
“– Sabe que puede actuar como quiera.”
“– Quizás ella sea un él por dentro. El dia que salga ya lo veremos.”
“– Creo que el imagen más sincera que he visto de él/ella fue hoy por la mañana, cuando se despiertó. Solo cuando se depierta es verdadera.”

Diziam tonterías, como estiveram os três fazendo durante toda o dia anterior, o que tornava a viagem cada vez mais divertida. Mas naquele momento, em que tentava por sentido em tudo o que seus sentidos percebiam, as bromas lhe caíram como mais informação a ser codificada.

Numa nova olhada pro horizonte se deu contado óbvio: às suas costas estava o futuro. Com uma leve inclinação de cabeça (sim, já conhecia o artifício) podia contemplar a paisagem futura mais próxima, segundos antes de se tornar presente. Mais que isso nao conseguia. Mais que isso nao se pode. Nem ela, nem a portuguesa, tampouco o mexicano. Assim é a vida.