quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Taficante de farinha

Mala de baiano que estuda no exterior, quando volta para Europa depois de um visita à terra natal, é um verdadeiro festival da culinária nordestina. Mesmo sabendo que é proibido transportar artigos alimentícios, ainda que nas malas despachadas, decidi seguir o exemplo da maioria dos brasileiros que conheço e trazer algumas “coisinhas” para fazer a alegria dos saudosos e preparar alguns quitutes baianos do lado de cá:

3kg de farinha de mandioca

2kg de goma para beiju

500ml de azeite de dendê

Cerca de 300g de camarão seco

1 pacote de doce de banana (daquele tijolão enrolado na palha)

37 caixinhas de Cocada Baianinha

1 pote de geléia da Chapada Diamantina

1kg de granola Tia Sônia (a melhor de todas!)

8 tubos de creme de cabelo (artigo de extrema necessidade)

Basicamente isso. Além, obviamente de roupas, calcinhas, sapatos, alguns livros e tudo o que malas comuns de viagem devem carregar.

Pois bem. Venho eu chegando, feliz e contente, no aeroporto de Barcelona, depois de uma viagem razoavelmente tranquila, quando um oficial desocupado, mas bem educado, me vê passando com as malas a uns 20m da porta de saída e resolve me tomar como passatempo:

“– Bom dia! Vêm de onde?”

“– Bom dia! Venho do Brasil.” ( xii…)

“– Por favor, passe as malas aqui no raio x”

“– Sim, claro!” (xiiii…)

E lá vou eu colocando as malas na esteira e pensando na cara que o cidadão faria quando visse o dendê e os camarões. Náo sei se por cansaço ou sei lá o quê, mantive a calma durante todo o tempo e pensei que o máximo que poderia acontecer era ele confiscar aquela feira toda e deixar minhas malas murchinhas.

Passa a primeira mala e ele olha para tela do raio x com uma cara intrigada:

“– O que a senhora leva aí?”

“– Hmm… é… sapatos, livros, cosméticos… e… algumas coisas de… é… ingredientes de comida típica da Bahia para alguns amigos” (xiiiiiii…)

“– …Passe a outra mala, por favor”

Olhou com a mesma cara, fez mais umas perguntinhas, mas se interessou por abrir a primeira, que era a menor de todas, mas pesava que era uma beleza. Não sem antes espancar a pobre da mala grande. Só depois entendi que estava averiguando se ela tinha um fundo falso.

Abri a mala e demos de cara logo com uma calcinha, o que já prenunciava meu constrangimento com toda aquela invasão. E lá foi ele futucando as coisas, olhando cada embalagem de creme, sacudindo, abrindo cada saquinho, isso tudo sem o menor cuidado de colocar nada no lugar. Até que chegou no fundo da mala, onde estava o que lhe interessava: as farinhas! Quando pegou o primeiro pacote, pensei logo “uhhh….me dei mal”. Calmamente perguntou:

“– Que é isso?”

“– Farinha de mandioca. É um artigo muito comum da Bahia, de onde venho, e serve para fazer comida”

O cidadão apertou, apertou, cheirou, tornou a apertar e largou. Ufa! Depois olhou com uma cara meio espantada pros outros dois pacotes iguais a este. Daí então partiu pro outro saco, onde estavam os pacotes de goma para beiju. Imagine a minha cara ao me dar conta que a goma é bem mais fininha e mais branca que a farinha de mandioca! Mais uma vez ele apertou, apertou, cheirou, mas agora com mais apreensão, o negócio era mais sério.

“– E essa? Para que serve?”

“– É um tipo de farinha para fazer o que chamamos de beiju” – e mostrei um rótulo no saquinho que explicava como preparar. “Se o senhor quiser pode abrir”.

Quando ele deixou a farinha de lado e continuou a mexer na mala lembrei do tijolo de doce de banana enrolado na palha e rezei para ele não encontrar. Pro meu alívio ele parecia se dar por satisfeito com as minhas explicações sempre bem simpáticas e tranquilas.

“– Mas para quê você traz tudo isso?”. Respirei fundo. Achei que ele fosse começar o fisco.

“– É que aqui tenho muitos amigos da mesma cidade que eu. Quando alguém viaja é normal pedir que tragam algumas coisas para preparar comidas típicas…”

Fim do interrogatório. Acho que convenci. Antes de me liberar deu mais uns socos da pobre mala grande, mas não me pediu que a abrisse (ufa! O dendê e o camaráo estavam nela!). Acho que foi por isso que a coitada nao resistiu e foi morrendo no caminho. Chegou em casa toda despedaçada.

4 comentários:

  1. que susto essa confiscada hein?! =D
    ri bastante aqui lendo...
    =D

    bjo!

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  2. ahahahaha...Ana Brasileña, me lembrei de uma música da Confraria da Bazófia, Djanira Brasileña, conheces? vou te mandar por e-mail...hahahaha

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  3. ahahah...
    Ana, ri muito lendo sua história... imagino bem sua situação...
    tirar farinha da mala de baiano é covardia...
    ainda bem que deu tudo certo.

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  4. Ei bocassanta... ja passei por isso tb... principalmente com a goma de beiju pois tive o mesmo pensamento... e fiz a mesma coisa que vc, ofereci pra abrir, cheirar, comer, até preparava um beiju pra ele ali na hora se ele quisesse... rsrsrs. Na verdade acho q da sua lista só o camarão era problemático, as farinhas e o azeite não. Bjos e saudades

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